“Chorei sangue”, diz “patriota” colocado em solitária na Argentina
Apesar do pedido oficial de refúgio político, Wellington não teve sucesso em sua tentativa de se proteger da extradição solicitada por Moraes.

O drama de Wellington Luiz Firmino, de 35 anos, condenado a 17 anos de prisão por envolvimento nos atos de 8 de Janeiro, ganha contornos ainda mais dramáticos fora do Brasil. Preso na Argentina desde 19 de novembro de 2024, o paulista de Sorocaba relata um cenário alarmante de violações de direitos humanos no presídio de Jujuy, onde passou 49 dias em uma solitária que descreve como “inferno na Terra”.
“Chorei lágrimas de sangue. Por muitas vezes, orei por minha morte”, relatou Firmino em entrevista. “A solitária aqui foi muito pior que os 11 meses na Papuda. Não havia sequer o mínimo de dignidade humana. Tinha fezes nas paredes, buracos abertos, e um colchão podre.” A fala de Firmino expõe não apenas as condições precárias do sistema carcerário argentino, mas também acende o debate sobre a extradição, a perseguição política e os limites da atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) na condução dos processos relacionados ao 8 de Janeiro.
Firmino, conhecido nas redes sociais por seu apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, foi libertado provisoriamente em novembro de 2023, mediante medidas cautelares. No entanto, em abril de 2024, recebeu um telefonema que mudaria sua vida mais uma vez: sua prisão havia sido decretada novamente, desta vez por decisão do ministro Alexandre de Moraes.
“Eu estava doando sangue, como faço há anos, quando o telefone tocou. Era a Polícia Federal me informando sobre a nova prisão. Entrei em pânico. Com a roupa do corpo e minha moto, fui em busca de socorro na Argentina.” A viagem durou 30 horas, até ele chegar a Buenos Aires, sem dinheiro, roupas ou qualquer estrutura.
Refúgio negado, sofrimento ampliado
Apesar do pedido oficial de refúgio político, Wellington não teve sucesso em sua tentativa de se proteger da extradição solicitada por Moraes. Em novembro, durante uma tentativa frustrada de fuga para o Chile com outros brasileiros em situação semelhante, Firmino foi recapturado pelas autoridades argentinas. Desde então, sua luta tem sido por sobrevivência.
Transferido em janeiro de 2025 para o Complexo Penitenciário de Ezeiza, na Grande Buenos Aires, ele divide cela com outros três brasileiros que também aguardam decisão sobre seus pedidos de extradição. A crise humanitária enfrentada pelos detentos brasileiros na Argentina escancara uma realidade dura, ignorada por boa parte da mídia tradicional.
“Eu estou com o braço ferido desde setembro de 2024, quando sofri um acidente de moto. Até hoje, não recebi a cirurgia de que preciso. Aqui, não há assistência médica, não há direitos humanos, não há dignidade. É como se eu não fosse um ser humano”, desabafa Firmino.
Abandono e politização da Justiça
A situação de Wellington Firmino reacende o debate sobre o uso político das decisões judiciais no Brasil, principalmente quando o nome de Alexandre de Moraes aparece como protagonista de medidas duras e controversas. A ordem de extradição, considerada excessiva por juristas internacionais, é vista por parte da sociedade como perseguição política, principalmente por envolver indivíduos com posicionamentos ideológicos específicos.
Para especialistas em direito internacional, a prisão de brasileiros no exterior sob ordens do STF levanta questionamentos sérios sobre o alcance da Justiça brasileira e os riscos de abuso de autoridade. “O princípio da soberania nacional e do refúgio político existe justamente para proteger indivíduos perseguidos por razões políticas. Quando isso é ignorado, há uma clara violação dos tratados internacionais de direitos humanos”, aponta o advogado internacionalista Felipe Bittencourt.
Apoio de comunidades e silêncio do Itamaraty
Apesar das condições precárias, Firmino relata que encontrou apoio em pessoas comuns durante sua permanência na Argentina. “Fui ajudado por estranhos, pessoas que me deram roupa, comida, orientação. Sem eles, eu não teria conseguido chegar nem até a delegacia para pedir refúgio.”
Enquanto isso, o Itamaraty mantém silêncio sobre o caso. Familiares de Firmino têm pressionado o governo brasileiro e parlamentares de oposição para que intervenham em favor do entregador. Até agora, no entanto, nenhum esforço diplomático foi feito em sua defesa.
Caminho incerto
A expectativa é que a Justiça argentina decida sobre o pedido de extradição ainda no primeiro semestre de 2025. Se for autorizado o retorno de Firmino ao Brasil, ele poderá cumprir o restante da pena em território nacional, sob custódia da Justiça Federal.
Enquanto aguarda, Wellington permanece no limbo jurídico, sem previsão de julgamento e em condições de saúde física e mental cada vez mais debilitadas.
“Estou destruído. Mas continuo orando. As orações da minha mãe me tiraram da solitária. Agora, só Deus pode me tirar dessa injustiça.”
O caso de Wellington Firmino se soma a uma série de episódios que evidenciam a complexa relação entre política, Justiça e direitos humanos no Brasil contemporâneo. E revela uma verdade incômoda: o preço da convicção ideológica, em certos contextos, pode ser cruelmente alto.
Comentários (0)